Debates em podcasts: palanque, polarização e os cortes
Quando um trecho viral vale mais que o argumento: por que os cortes transformam debates em espetáculo
OPINIÃO
Lucas Trevizan Ferreira
8/21/20252 min read
“Hoje em dia, todo mundo tem um podcast” é uma frase comum quando se fala do crescimento desse conteúdo nas redes. O podcast enquanto formato é hoje um dos principais meios de entretenimento na internet. Canais como o Inteligência Ltda., Podcast 3 Irmãos, Podpah e Flow se tornaram importantes meios de comunicação no Brasil, e seu “carro-chefe” são os debates.
Os debates acontecem de diferentes maneiras, um modelo que ganhou destaque recentemente é o de 1x20, onde um membro de algum grupo do espectro político enfrenta 20 opositores. O modelo mais comum é o de duas pessoas de opiniões diferentes, ou opostas, tomando turnos de fala.
Esse tipo de conteúdo é constantemente usado para embates entre a direita e a esquerda. E é comum nas redes sociais que se eleja um vencedor. Porém, serão esses debates de fato relevantes para discussões políticas?
Um debate organizado como uma competição não visa o convencimento ou o amadurecimento de ideias, mas sim a teatralidade e a estética. Para os participantes desses programas a retórica se torna o foco principal e a informação se torna secundária.
A maior parte desses programas não exibe checagem de fatos, e deixam nas mãos dos espectadores a crítica das informações. Muitos ganharam relevância com a participação em podcasts. Figuras de direita como Paulo Kogos, Arthur do Val, Kim Kataguiri e recentemente Jones Manoel para a esquerda, aparecem em vários episódios de podcasts como Flow, Inteligência Ltda. e 3 irmãos.
Pode-se dizer que a extrema-direita cresceu nessas plataformas, através de discursos simplistas e dados imprecisos, enquanto a esquerda apenas há pouco tempo tem sido capaz de aumentar seu alcance. Um problema causado por isso é o aumento da polarização devido ao viés de confirmação incentivado por esses debates. É comum que espectadores assistam a esses embates e elejam seu próprio representante como ganhador, de forma que saem ainda mais convencidos de seus próprios vieses.
Ian Neves, criador de conteúdo do coletivo marxista-leninista Soberana, é crítico a esse formato de debates. Para o historiador participar desses programas pode ser prejudicial para a disseminação de seus ideiais.
“Desde que os debates têm tomado mais espaço na internet, eu tenho sido perguntado do porquê eu não participar… na minha concepção, esse tipo de debate é na melhor das hipóteses inútil e na pior das hipóteses, prejudicial pro nosso campo.”
~Ian Neves
Jones Manoel, também de esquerda, já demonstra uma atitude diferente. Manoel tem construído uma grande base de seguidores, e isso aparenta ser em grande parte devido a sua participação em debates.
É evidente que os podcasts são um grande palanque para figuras políticas, porém é pode ser prejudicial na disseminação de ideias e reforçar vieses. Um fator que contribui para isso são os cortes.
Um dos grandes pontos que leva a participação desses programas é a produção de cortes. Os cortes são trechos tirados desses podcasts e postados pelos participantes em suas redes sociais. Esses trechos são curados e editados para favorecer a imagem do participante, o que pode causar em seus seguidores a falsa sensação de domínio unilateral do debate.
A espetacularização dos debates é um grande problema, o uso dessas plataformas como uma fábrica de cortes pode ser prejudicial para as discussões políticas no geral, além de agir como um reforço de vieses e polarização. Porém é inegável que a participação nesses programas favoreceu o crescimento de muitas figuras políticas da internet.
Referências:
NEVES, Ian. Desde que os debates têm tomado mais espaço na internet, eu tenho sido perguntado do porquê eu não participar… [Twitter/X], 31 jul. 2025. Disponível em: https://x.com/ianfneves/status/1950974532312797422. Acesso em: 19 ago. 2025.